sábado, 3 de maio de 2008

O amor é uma coisa, a vida é outra!

Muito do que se segue pode ser incompreensível. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito clara. O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Simplesmente porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas, das calças e das contas da lavandaria. Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e á mínima merdinha.. O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem, tomam decisões. A paixão, que devia ser desmedida não o é mais.. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas. Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há. Estou farta de conversas, farta de compreensão quando não há, farta de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raia de capangas de cantina, malta do "tudo bem, tudo bem", tomadores de bicas, aliciadores de compromissos, bananas, matadores do romance. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida e outra. O amor não e para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso “da lá um jeitinho sentimental". Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, abraços, flores e chocolate. O amor foi trespassado ao pessoal do chinelo e da serenidade. Amor é amor! O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra! A vida as vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma a desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade! É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha.. É o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a Vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E vale-la também.

1 comentário:

Anónimo disse...

e qual nao foi a minha surpresa descobrir este tesourinho internetiano menina cheila! vou fazendo aqui umas visitinhas regulares, se nao te importares sim ?
e este texto.. miguel esteves cardoso! tanto significado, mesmo.
Beijinho e força na escrita!